Escuta Bem funciona ao induzir ansiedade, mas sua dinâmica repetitiva abala a confiança do espectador.
Em uma sessão de perguntas e respostas após a estreia de Listen Carefully no XX Fantaspoa, o diretor Ryan Barton-Grimley revelou a importância pessoal deste filme para ele. Filmado com apenas 50 mil dólares e muito improviso, sobretudo nas ruas de Los Angeles durante a noite, a obra é baseada em um pesadelo recorrente que tinha após o nascimento de seu filho.
Os primeiros dez minutos são um excelente ilustrativo de seu pesadelo, no qual o protagonista, interpretado pelo próprio diretor, é perseguido por estranhas criaturas que se parecem com homens, mas possuem assustadores rostos de bebês, e assumem uma postura agressiva.
Quando acorda de seu sono, o longa se dedica a apresentar a vida do personagem, de forma a justificar sua ansiedade. Pai de primeira viagem, “workaholic”, e ainda preocupado em relação aos cuidados do bebê, são naturais seus medos e receios na criação e cuidados de uma criança, algo que exige uma responsabilidade para a qual muitos não estão prontos para assumir. É a partir desse medo que seu bebê é sequestrado, e leva o protagonista em uma jornada para confessar seus pecados e salvar a criança.
Nesse sentido, existe uma boa linha de debate a respeito da paternidade, e toca em preocupações reais e genuínas em relação à criação de um filho, sobretudo na forma como existe o estabelecimento de uma relação amorosa e afetiva, desde o primeiro minuto, entre o pai e o bebê. O medo de perder a criança é tão sério que leva o personagem a caminhar pelos piores e mais obscuros lugares de seu subconsciente, parte desse que reflete no de seu diretor.
Mas apesar da proposta promissora, seu caráter pessoal para o cineasta, e sobretudo os milagres feitos com o limitado orçamento, Listen Carefully tem dificuldades para encontrar o caminho que deseja seguir. Sem exatamente achar uma saída para tantos pesadelos subsequentes, acaba por inserir um dentro de outro, formando um grande ciclo vicioso onde vai perdendo gradativamente a confiança de seu espectador a medida em que nada se revela real.
O inconsciente do protagonista é até interessante pela maneira como é explorado, manifestado através de criaturas estranhas e figuras opressivas, mas pouco vai além dos desvios financeiros que pratica em relação à empresa em que trabalha e o medo de perder a criança. Esse monte de voltas em torno do próprio eixo gera, com efeito, boa ansiedade no espectador, como Barton-Grimley realmente nos consegue fazer sentir, mas toda a violência gráfica que emprega ou sustos e reviravoltas se tornam meros recursos vazios quando o filme pouco se aprofunda, de fato, em seu protagonista durante seus oitenta minutos de duração.
Essa repetição desnecessária e receio de arriscar para outros caminhos enfraquece Listen Carefully, que, novamente, surpreende pela alta qualidade e baixíssimo orçamento, mas não consegue sustentar as mesmas ideias por tanto tempo sem frustrar o espectador ao insistir sempre nos mesmos elementos. Acredito que funcionaria infinitamente melhor caso se resolvesse como um curta ou média-metragem, onde poderia abraçar essas ideias sem a necessidade de repeti-las durante tanto tempo.
Avaliação: 3/5
Escuta Bem (Listen Carefully, 2024)
Direção: Ryan Barton-Grimley
Roteiro: Ryan Barton-Grimley
Gênero: Terror, Thriller
Origem: EUA
Duração: 82 minutos (1h22)
Assistido no XX Festival Fantaspoa.
Sinopse: Quando a filha recém-nascida do atrapalhado funcionário de banco, Andy McNeary, desaparece, ele deve seguir as instruções de uma voz misteriosa do outro lado de um monitor de bebê para salvá-la antes que ela desapareça para sempre. (Fonte: Fantaspoa)
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