top of page
Foto do escritorHenrique Debski

CRÍTICA | Uma Ideia de Você, de Michael Showalter (The Idea of You, 2024)

Com a proposta de seriedade, Uma Ideia de Você é inverossímil e contraditório, ao defender, sem querer (querendo), o etarismo.



Desde seu anúncio e estreia em festivais, Uma Ideia de Você se vendeu com a proposta de colocar o dedo em uma antiga ferida da sociedade, algo ainda por muitos não aceito ou bem visto, apesar do ar cada vez mais progressista de nosso mundo. É o caso dos relacionamentos entre pessoas com idades muito distantes.

 

Na trama, Solène, uma mãe solteira de 40 anos e dona de uma galeria de arte em uma cidade pequena no interior da Califórnia, em uma viagem a um festival de música com sua filha adolescente, começa um romance com Hayes Campbell, de 24 anos, o vocalista da August Moon, uma boyband conhecida internacionalmente.

 

Em seus primeiros minutos, Solène, muito bem na pele da versátil e carismática Anne Hathaway, é construída pela direção de Michael Showalter através de um olhar realista. Esse retrato verossímil da protagonista e do mundo a seu entorno, no entanto, dura apenas até o primeiro encontro da personagem com seu par, que, por si só, já quebra com a proposta de realismo. Isso porque, se não bastasse uma série de elementos flexibilizados para proporcionar esse encontro, como a ausência de câmeras de segurança, guardas e portas trancadas, o primeiro contato entre eles é algo que naturalmente foge da reação comum de qualquer ser humano, seja pela falta de noção espacial dela, ou pelo estranho fascínio dele por uma pessoa aleatória invadindo uma área restrita para usar o banheiro, e sem nem perceber.

 

Mas o clichê ao qual Uma Ideia de Você se entrega não seria problema se o filme também não renegasse, por outro lado, sua própria discussão. Afinal, é colocado para debate o relacionamento entre uma mulher de 40 anos, divorciada e mãe, com um jovem de 24 anos, cantor mundialmente conhecido – algo que nem deveria ser objeto de problema, mas ainda, para muitos, egoisticamente, pode soar incômodo.

 

A priori, Showalter apenas toca em alguns pontos sobre o relacionamento a partir de conversas entre eles, mas reforça uma paixão ardente que vai além do mero prazer carnal, quando o olhar de admiração e compreensão mútua dizem muito mais do que palavras jogadas fora. Nisso as performances de Hathaway e Nicholas Galitzine se sobressaem, e de longe se tornam o melhor elemento do longa, pela naturalidade e sutileza com a qual observam um ao outro, ainda que a direção não saiba aproveitá-los tão bem nos momentos íntimos, com uma câmera trêmula e montagem que não valoriza o prazer, mas destaca a passagem de tempo.

 

Acontece que os conflitos inseridos pelo roteiro de Michael Showalter e Jennifer Westfeldt não conseguem se adaptar à realidade indecisa criada pelo filme, que se coloca entre a tentativa de ser realista a partir de clichês de comédias românticas. Nesse dilema paradoxal, quando ameaça o relacionamento, o texto se agarra a questões insignificantes demais, e injustos à protagonista, mesmo que o filme tente defende-la. À título de exemplo, toda a conversa na piscina da casa na Itália, já com mais de uma hora de projeção, coloca a personagem de Hathaway em uma berlinda humilhante e sem necessidade, que vai desde as garotas jovens até o maiô utilizado por ela, em uma insegurança que não combina em nada com a personalidade de Solène – o que até a contradiz.

 

Se não bastasse a humilhação, existe uma conveniência latente utilizada pelo texto nos momentos estratégicos para trabalhar com a opinião pública e as reações no entorno dos personagens, em um mundo contemporâneo com uma tecnologia lenta e burra, e reações que facilmente parecem ter saído dos anos 90, enquanto exageradas no número de paparazzis com câmeras analógicas, ignorando celulares, e os trazendo apenas quando precisam constranger a protagonista de formas até inverossímeis e com rapidez.

 

Quando precisa argumentar, o longa insiste em comparar as situações passadas pela protagonista e seu ex-marido com o presente vivido por ela e Hayes. Porém, é de se perceber que nem de perto são situações que se assemelham, ancorando discussões entre o casal com base em diferenças que as tornam incomparáveis.

 

E então, chegando no terceiro ato, Uma Ideia de Você toma uma decisão em relação aos dois – a mesma que encerra o livro que lhe serve de base, de mesmo nome e escrito por Robinne Lee. No entanto, apesar do beco sem saída que cria para si, no qual qualquer caminho levará a uma contradição parece que Showalter, não contente com a resolução, decidiu mudá-la com a inserção de um epílogo, que continua, por alguns minutos, a narrativa.

 

Como todo o restante, receoso demais em abraçar a polêmica e realmente defender algo a respeito da relação, a existência deste epílogo apenas reforça a covardia de todo o projeto, com uma solução fácil, óbvia e que bate o martelo do etarismo, que, de uma vez por todas, assume a infinita contradição de sua própria proposta.

 

Avaliação: 2/5

 

Uma Ideia de Você (The Idea of You, 2024)

Direção: Michael Showalter

Roteiro: Michael Showalter e Jennifer Westfeldt, adaptado de Robinne Lee (livro)

Gênero: Romance, Drama

Origem: EUA

Duração: 115 minutos (1h55)

Disponível: Prime Video

 

Sinopse: Solène, uma mãe solteira de 40 anos e dona de uma galeria de arte em uma cidade pequena no interior da Califórnia, em uma viagem a um festival de música com sua filha adolescente, começa um romance com Hayes Campbell, de 24 anos, o vocalista da August Moon, uma boyband conhecida internacionalmente.

(Fonte: IMDB - Adaptado)

9 visualizações0 comentário

Comments


bottom of page