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Foto do escritorHenrique Debski

CRÍTICA | Motel Destino, de Karim Aïnouz (Idem, 2024)

Conhecendo bem suas inspirações, o Motel Destino de Karim Aïnouz é um thriller que subverte o prazer e o transforma em prisão.



O cinema de Karim Aïnouz é de longe bastante dedicado em se reinventar a cada novo filme, transitando entre os mais diversos gêneros, estilos, estéticas narrativas e até idiomas, em constantes exercícios de fazer cinema das mais diversas maneiras.

 

E Motel Destino é mais uma dessas tentativas de buscar por algo novo, válido para sua própria carreira e também para o cinema nacional, através de um thriller erótico que busca suas referências dentro e fora do Brasil. No cenário nacional, as típicas pornochanchadas do século XX, o carro-chefe do cinema brasileiro durante boas décadas, encontra espaço na mescla com a tensão formal e temática típica de Brian De Palma, no uso dos belos tons de neon e na atmosfera que transborda o sentimento de tesão, enquanto os personagens, perdidos no mundo e entre seus próprios demônios pessoais, lembram as típicas narrativas realistas de Paul Schrader.

 

No entanto, em meio a tantas influências, ainda sobra muito espaço para a originalidade, quando, unidos e bem aproveitadas, se constrói uma grande trama neo-noire à brasileira. Para além do local em que passa, no interior cearense, o motel é um claro exemplo dessa presença local, quando uma instituição típica e muito presente em nosso país, na forma como é (já explorado, inclusive, em outro filme deste ano, Eros, de Rachel Daisy Ellis).

 

Fugindo da organização criminosa da qual fazia parte, o protagonista Heraldo, vivido por Iago Xavier, se refugia no motel administrado por Elias e Dayana, muito bem vividos pela dupla Fábio Assunção e Nataly Rocha. Em uma clara tentativa de encontrar naquele espaço uma válvula de escape para as violências do mundo exterior, o protagonista se depara com uma realidade igualmente dura dentro daquele ambiente, que, se de um lado é um antro de prazer, nos fundos esconde agressões e o sufocamento de uma vida a partir de uma relação.

 

É nessa perspectiva que Karim nos envolve na contramão da expectativa de um filme que se passa em um motel, subvertendo sua figura em prol de um ambiente de desconforto ao espectador, tanto quanto o é aos personagens. Não à toa o cineasta constantemente o filma sob uma estética prisional, que vai desde o monitoramento ininterrupto dos corredores pelas câmeras de segurança até as janelas de serviço dos quartos, no qual as pessoas que ali trabalham são as que se encontram verdadeiramente presas e amarradas a destinos que não necessariamente desejam.

 

Mas esse sufoco não vem apenas do ponto de vista da prisão, mas também de um aspecto sexual, na sensualização dos corpos diante do escaldante calor do Ceará, e desenvolvendo-se em um triângulo amoroso cujo lado secreto e transgressor da relação torna-se sinônimo de liberdade.

 

O problema maior, entretanto, é o como esse lado mais tenso, e a razão para Motel Destino ser um thriller neo-noire, acaba por se desenvolver dentro de uma zona de conforto que não combina com a proposta da própria obra, enquanto desagua em um terceiro ato fácil e frágil, com uma grande mão amiga do roteiro guiando os personagens para destinos óbvios dentro daquilo que se estabelece, sem qualquer catarse ou até intensidade.

 

Fora que toda a realidade dos muros do motel para fora, justamente por onde anda o ato final, parece dotada de uma falta de inteligência ímpar que favorece o caminho desejado, que vai desde uma organização criminosa com muitos integrantes incapaz de encontrar o protagonista (escondido no motel, e naquela cidade pequena um lugar óbvio para se esconder, diga-se de passagem), até passagens fantasiosas, que flertam com o terror, que pouco encontram lugar na obra, e tornam-se até um desfoque.

 

Não que isso tudo faça de Motel Destino um filme ruim – de maneira alguma, aliás -, mas certamente enfraquece uma narrativa que poderia ir muito além. Ainda assim é bom assistir a um filme cujo diretor, cinéfilo, conhece bem de suas referências, e não as usa de maneira vazia, mas adapta dentro de sua realidade e transforma em algo original, e tipicamente brasileiro, com a qual podemos nos identificar.

 

Avaliação: 3.5/5

 

Motel Destino (Idem, 2024)

Direção: Karim Aïnouz

Roteiro: Karim Aïnouz, Wislan Esmeraldo e Mauricio Zacharias

Gênero: Thriller, Drama

Origem: Brasil, França, Alemanha, Reino Unido

Duração: 115 minutos (1h55)

Disponível: Cinemas (via Pandora Filmes)

 

Sinopse: Sob o céu em chamas numa beira de estrada do litoral cearense, o Motel Destino é palco de jogos perigosos de desejo, poder e violência. Uma noite, a chegada do jovem Heraldo, fugindo de seu presente, transforma em definitivo o cotidiano do local. (Fonte: Pandora Filmes e Sinny Comunicação)

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