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Foto do escritorHenrique Debski

CRÍTICA | Monster, de Kore-eda Hirokazu (Idem, 2023)

Os dilemas da vida quando criança e a contaminação pela culpa das escolhas tomadas, em um grande estudo de pontos de vista por Koreeda.



Todo conflito é complexo o suficiente para ter mais de uma versão. Como seres humanos, estabelecemos nossas relações com base em nossa percepção do mundo, nossa subjetividade, e agimos e reagimos de acordo com os valores a nós inerentes.

 

Akira Kurosawa abordou a subjetividade e a busca pela verdade nos anos 1950 através de “Hashomon”, dando origem à estrutura apelidada “hashomoniana”. Em seu drama “Monster”, o cineasta Hirokazu Koreeda usa-se desta estrutura, mas com outra intenção.

 

Se Kurosawa planejava retratar o afastamento da verdade através da inquirição e da colheita de múltiplos pontos de vista, sempre parciais, gerando uma espécie de “verdade virtual”, Koreeda adota um olhar de imparcialidade, que entrega ao espectador a possibilidade de montar o quebra-cabeça, atingir uma “verdade real”, e compreender o como uma sequência de mal-entendidos e mentiras, a partir de visões distintas, fizeram a narrativa chegar àquele estado.

 

Para tanto, Koreeda nos manipula. Direciona nosso olhar forçando por intermédio de uma visão, e nos induz a sentir a opressão de uma mãe com as mãos atadas diante de um corpo docente que não a esclarece sobre os eventos ocorridos em sala de aula. Ao mesmo tempo, nos faz ver o lado do professor e compreender seu olhar acerca da personalidade do aluno Minato.

 

Quando chega na vez da perspectiva de Minato, tudo faz sentido. Entendemos seus sentimentos, seus demônios internos e a culpa, pois, afinal, em “Monster” a culpa contamina tudo, desde a criança até a diretora, através de mentiras, que naturalmente geram arrependimentos. E como já tendo sido crianças, não é difícil nos colocarmos no lugar dos personagens. Sabemos o quão difícil pode ser se adequar em determinado grupo, se alocar numa sociedade tão julgadora, que dita os costumes, o certo e o errado, de maneira egoísta. E, para muitos, pode ser que o filme funcione como um espelho.

 

Com isso, os demais pontos de vistas conseguem se justificar. O roteiro de Yûji Sakamoto tem muito cuidado em posicionar suas informações de forma que aos poucos conseguimos, como espectadores, encontrar sua fonte. Esse exercício de “detetive” que nos é oferecido vem através da suavidade do texto, e nos envolve com a possibilidade de traçarmos nossos próprios caminhos nessa investigação, tão bem construída ao ponto de nos oferecer mais de um final possível, a depender de como e onde enxergamos as cartas colocadas à mesa. E nisso, a direção é sutil ao não nos entregar seus segredos de bandeja, os inserindo nos detalhes, sem alarde e, menos ainda, sem exposição.

 

Quando chega ao fim, “Monster” é como um soco no estômago. Os minutos finais, apesar de dolorosos, encerram o filme numa atmosfera catártica que, noutra perspectiva, nos traz uma inquietante (e estranha) sensação de alívio.


Avaliação: 5/5


Monster (Idem, 2023)

Roteiro: Yûji Sakamoto

Gênero: Drama, Thriller

Origem: Japão

Duração: 127 minutos (2h07)

Disponível: Cinemas (via Imovision)


Sinopse: Uma mãe sente que há algo errado quando seu filho começa a se comportar de maneira estranha. Ao descobrir que um professor é o responsável, ela vai até a escola exigindo saber o que está acontecendo. Enquanto o caso se desenrola pelos olhos da mãe, do professor e da criança, a verdade começa a surgir. (Fonte: Imovision)

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