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Foto do escritorHenrique Debski

CRÍTICA | Guerra Civil, de Alex Garland (Civil War, 2024)

A Guerra Civil de Alex Garland é mais dolorosa por colocar o próprio norte-americano como causador e vítima do conflito, em seu filme mais realista.



Em toda sua ampla experiência como roteirista e diretor, o cineasta Alex Garland sempre circundou entre a ficção científica e o terror, desde seus trabalhos em Extermínio até seu último longa, Men. Pela primeira vez, com um projeto diferente que não necessariamente sai de sua zona de atuação, Garland propõe em Guerra Civil um cenário caótico nos Estados Unidos, na forma de uma distopia em que os estados mais diversamente políticos (Califórnia e Texas) unem forças para derrubar um presidente tirânico que atenta contra o próprio povo norte-americano.

 

Mas o diretor não se importa muito com as razões do conflito, ou tampouco com seu desenrolar. Todo esse caos é apenas o pano de fundo para seus protagonistas, jornalistas de guerra, se dirigirem em direção ao epicentro da batalha para registrarem os acontecimentos através das imagens que produzem. Seus destinos finais também não têm tanta importância, quando se tem em vista a jornada que farão e tudo aquilo que irão ver e passar por.

 

Não à toa que os personagens colocados dentro do carro acumulam tantas diferenças entre si. Apesar de todos exercerem a mesma profissão, as diferentes idades e origens propiciam interessantes debates acerca da situação em que se encontra o país, pautado em suas experiências pessoais e distintas visões do que de fato representa aquele conflito, na medida em que a vitória de qualquer dos lados leva a um enorme ponto de interrogação para o destino do país e de seu povo.

 

É justamente nesse aspecto que se fundamentam os embates relacionados a Stephen McKinley Henderson e Wagner Moura – ambos excelentes -, enquanto possuem intuições diferentes, que se convergem no plano da incerteza e do receio.

 

De outro lado, Kirsten Dunst e Cailee Spaeny criam uma relação de tutora e aprendiz, que se funda no desgaste da veterana e no vigor de curiosidade da novata. O arco da personagem de Dunst, inclusive, se constrói tendo em vista seu histórico como grande jornalista, que por vezes nos confere a possibilidade de assistir à algumas de suas experiências passadas através de suas memórias, cobrindo conflitos armados em diversos países e assistindo as mais diversas atrocidades. Enquanto vê a profissão com ceticismo, perspectiva essa muito reforçada quando conversa com sua “pupila”, algo a todo tempo potencializa seu desespero: a guerra, desta vez, acontece em sua própria casa, e os registros são da morte e sofrimento de seus próprios vizinhos.

 

Quando entram no campo de batalha e dão as caras ao perigo em prol do registro fotográfico, Garland não os poupa da violência que verão, essa que chega até a nós mesmos, espectadores. Entre os momentos de ação, o diretor transforma a câmera dos jornalistas em sua arma, carregada com filme ou cartões de memória, usando a alavanca manual do instrumento de um dos personagens como meio de reforçar essa comparação. Mais do que o fuzil capaz de matar uma pessoa, a fotografia tem igual poder condenatório no plano social, que, divulgadas ao público, os permite tirar suas conclusões a partir de um fato documentado na imagem, evidenciando, assim, o poder transformacional do jornalismo, usado como ferramenta ou como veneno, para o bem e para o mal.

 

Os meios utilizados para fotografar momentos da guerra se tornam angustiantes não apenas pela violência, mas também na maneira como o cineasta filma os conflitos tomando cuidado para não os tornar espetáculos, e impactar através do realismo de uma câmera na mão testemunhal, que persegue os jornalistas enquanto se infiltram em meio a uma troca de tiros, de tal forma que capta, por parte deles, a banalização de uma situação de risco, como todas as apresentadas. Da mesma forma, a violência também é banalizada, de forma crítica, sobretudo pelos próprios cidadãos norte-americanos, militares ou não, que usam da ausência de controle social do país para exercer suas vontades mais profundas e nefastas naquele momento sem leis, algo que a direção reforça por meio da trilha musical.

 

Assim, é muito visível as influências do terror de Alex Garland em Guerra Civil, que, apesar de descrever-se como um thriller de ação político e distópico, no fundo carrega todo o espírito e os elementos de um filme de terror. E a parte mais assustadora é que, diferentemente de Men, por exemplo, o presente não corre para o lado da fantasia. A “guerra civil”, apesar de fictícia naquele contexto, é estatisticamente viável para qualquer país do mundo, onde o próprio povo, diante de uma discordância, decide lutar à força para impor sua posição – os próprios Estados Unidos são prova dessa vivência. E o cineasta faz seu filme com justamente um toque deste receio, na narrativa mais “pé no chão” de sua filmografia como diretor até o momento.

 

Avaliação: 5/5

 

Guerra Civil (Civil War, 2024)

Direção: Alex Garland

Roteiro: Alex Garland

Gênero: Thriller, Ação

Origem: EUA, Reino Unido

Duração: 115 minutos (1h55)

Disponível: Cinemas (via Diamond Films)

 

Sinopse: Em um futuro distópico, um grupo de jornalistas de guerra percorre os Estados Unidos durante um intenso conflito que envolve toda a nação.

(Fonte: IMDB - Adaptado)

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