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Foto do escritorHenrique Debski

CRÍTICA | Bizarros Peixes das Fossas Abissais, de Marão (Idem, 2024)

A animação dirigida por Marão usa-se de um humor surrealista e do non-sense para falar, com seriedade, sobre a vida.



Os primeiros minutos de “Bizarros Peixes das Fossas Abissais” são de puro estranhamento. Um senhor simpático fala algumas palavras em um plano de estética incolor. Pouco depois, acompanhamos uma moça, obcecada por pedaços de algo que não sabemos o que é, lutando para proteger um simples caco de cerâmica, o único objeto colorido, enquanto luta de formas inusitadas contra homens que desejam a mesma coisa. Em meio a transformações estranhas, uma nuvem falante entra em cena, e logo mais conhecemos uma tartaruga super organizada.

 

Apesar do choque inicial, muito natural para quando não se sabe sobre o filme, nos afeiçoamos aos personagens com demasiada rapidez, quando se reúnem e juntam esforços para ajudar a moça a encontrar aquilo que procura. No entanto, enquanto possuem características únicas e úteis, cada um enfrenta uma dificuldade. Os poderes de transformação da protagonista acompanham efeitos colaterais ao mundo quando utilizados; a nuvem, tímida, sofre de incontinência pluviométrica; e a tartaruga possui TOC.

 

É muito divertido que, ao avançar da narrativa, o trio não só precisa compreender as características uns dos outros, mas também amadurecer ao enfrentar suas próprias questões pessoais. Claro, para um filme de 75 minutos não há que se cobrar ampla profundidade, mas a direção de Marão sabe aproveitar o que tempo que tem em mãos para dedicar-se a cada um de seus personagens, e inseri-los em um contexto de surrealismo non-sense puramente brasileiro, com piadas que referenciam diretamente nossa cultura, política e brincam com a ingenuidade e também a ambiguidade.

 

E nada acontece em vão. Os desafios se escalonam num esquema que beira um jogo de videogame. Começam com certa simplicidade, de forma a entender as funções e especialidades de cada um, para, a medida em que avança, tornarem-se maiores. Tudo para chegar nas fossas abissais.

 

Nesta etapa, o que mais chama atenção é o design criativo dos bizarros peixes da região (que não à toa nomeiam o filme). O ambiente é profundo, desconhecido, inexplorado. Toda essa sensação é passada no ápice da estranheza, especialmente visual, num espaço com uma dinâmica própria. Entretanto, a ausência de diálogos deixa a impressão de o segmento ser mais longo do que poderia, apesar de funcionar também com a ideia da busca pelo tesouro.

 

Ao terminar o filme, para além de todo seu design e traços característicos, a obra de Marão deixa algo mais para os espectadores, para além da memória visual. São suas verdades, frases que soltas podem soar clichês, mas cujo roteiro de “Bizarros Peixes das Fossas Abissais” faz questão de demonstrar sua importância e veracidade. Afinal, o que somos nós sem nossas memórias? A vida é curta, passa rápido demais, e precisamos aproveitá-la. Seu desfecho pode não soar feliz, mas é o mais verdadeiro: existem coisas na vida impossíveis de curar. E o mal de Alzheimer é uma delas. Criar memórias, aproveitar cada momento e viver feliz é o melhor que podemos fazer até chegar nosso inevitável encontro com o fim.


Avaliação: 4.5/5


Bizarros Peixes das Fossas Abissais (Idem, 2024)

Direção: Marão

Roteiro: Marão

Gênero: Comédia, Animação

Origem: Brasil

Duração: 75 minutos (1h15)


Sinopse: Uma mulher com superpoderes, uma tartaruga com TOC e uma nuvem com incontinência pluviométrica mergulham em uma aventura ao redor do mundo e nas profundezas do oceano em busca de um tesouro. 

(Fonte: Letterboxd - Adaptado)

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