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Foto do escritorHenrique Debski

CRÍTICA | Assassino por Acaso, de Richard Linklater (Hit Man, 2024)

Em Assassino por Acaso, Richard Linklater explora a transformação da personalidade humana com uma comédia romântica baseada na vida de Gary Johnson.



Fazendo novamente uso de sua habilidade em explorar o padrão de comportamento do ser humano a partir do cinema, com verossimilhança e naturalidade, Richard Linklater retorna à direção de longas em live-action, dessa vez com ênfase na transformação da personalidade.

 

Na trama, Gary (vivido por Glen Powell) é um professor universitário que ensina filosofia e psicologia, e assume um trabalho de meio período na polícia para complementar a renda instalando equipamentos de captação para operações de flagrantes forjados. Mas tudo muda quando o policial designado para o flagrante não pode participar da operação, e Gary é colocado em campo para interpretar um assassino profissional em uma reunião com um possível cliente.

 

Inspirado pela pessoa real de Gary Johnson, falecido em 2022, Linklater estabelece claramente, a partir de uma narração em voice over do protagonista, sua intenção de subverter todo o já conhecido estilo de thrillers românticos e policiais centrados em assassinos de aluguel. E o cineasta começa a executar sua ideia a partir do momento que seu personagem é, na realidade, um assassino falso.

 

Ao contrário da série Barry, por exemplo, referenciada em uma colagem de cenas pela própria obra, o assassino é apenas um personagem construído por Gary, que nunca tirou uma vida sequer. Mas na prática, seu significado vai muito além de uma mera necessidade surgida em razão do trabalho, mas na maneira pela qual o protagonista percebe que pode se transformar na pessoa da qual ele gostaria de ser.

 

Nisso, o trabalho de Glen Powell é fundamental para que a narrativa funcione diante das câmeras, na medida em que, demonstrando toda sua versatilidade, passa, genuinamente diante de nossos olhos, por um processo de transformação, do estereótipo “nerd quadrado e certinho, repleto de insegurança e timidez” para um homem seguro que toma para si o controle das situações nas quais se envolve, tudo sem que soe tosco ou cafona, mas se adequando perfeitamente ao estilo de humor sagaz adotado pela obra.

 

Essa versatilidade, inclusive, vai além de algo progressivo, que acontece a longo prazo, mas é também instantâneo enquanto encarna diferentes personalidades em questão de segundos – a cena que antecede seu primeiro trabalho é um ótimo exemplo, quando entra pelos fundos do restaurante ansioso e resmungando para logo em seguida torna-se seguro e controlado em um piscar de olhos, com a câmera o observando de uma maneira parecida, mas confusa. O figurino, é claro, colabora pela forma como o personagem se veste, e os adereços roubam a cena pelos detalhes que fazem a diferença, mas são os trejeitos de Glenn Powell que nos convence de verdade sobre quem está interpretando.

 

Por vezes, o roteiro assinado por Linklater e Powell comenta verbalmente essa transformação a partir do olhar de quem está a volta de Gary, mas durante a maior parte do tempo esse processo é demonstrado com sutileza pelas relações do protagonista com outras pessoas, mais dispostas a ouvi-lo e nele confiar, respeitar ou temer, e sobretudo pela imagem, na contraposição da maneira como a câmera o retrata no início e no final.

 

Nesse meio, o romance encontra lugar como forma de criar um conflito para movimentar a narrativa, mas também é usado como ponto de reflexão ao protagonista, não apenas pela questão moral criada, como forma de compreender sua personalidade, mas também em como funciona como catalisador, ao criar a necessidade de que se decida a respeito de quem deseja efetivamente ser, o forçando a tomar uma posição.

 

Apesar do epílogo exagerar um pouco na dose do bom limite pelo qual Assassino por Acaso funciona muito bem, o filme é mais um grande acerto de Richard Linklater em falar sobre o ser humano, discorrendo sobre identidade e sustentando o discurso, verdadeiro, de que podemos ser quem desejamos, contanto que acreditemos em nós mesmos. É uma obra para ser assistida por mais de uma vez, e creio que será debatida sob os mais diversos pontos de vista, acadêmicos e profissionais, aos olhos do Direito, Psicologia e até Filosofia.

 

Avaliação: 4.5/5

 

Assassino por Acaso (Hit Man, 2024)

Direção: Richard Linklater

Roteiro: Richard Linklater e Glen Powell, baseado em Skip Hollandsworth (artigo publicado na revista Texas Monthly)

Gênero: Comédia, Romance, Thriller

Origem: EUA

Duração: 115 minutos (1h55)

Disponível: Cinemas (via Diamond Films)

 

Sinopse: Gary Johnson trabalha para a polícia e finge ser um assassino de aluguel para prender aqueles que o contratam, até que ele quebra o protocolo para tentar salvar uma mulher desesperada, presa em um relacionamento abusivo.

(Fonte: Diamond Films/Sinny Comunicação - Adaptado)

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