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Foto do escritorHenrique Debski

CRÍTICA | A Filha do Palhaço, de Pedro Diogenes (Idem, 2024)

O palhaço e sua filha não dão risadas, mas tentam afastar as mágoas e se reconciliar no excelente drama de Pedro Diogenes.



Logo na primeira cena de A Filha do Palhaço, Pedro Diogenes coloca a distância como um dos elementos centrais de sua narrativa. Nela, vemos a adolescente Joana, em seus 14 anos, chegando a um bar e se sentando relativamente distante ao palco, no qual se apresenta Renato, seu pai ausente e que há tempos não vê, vestido como mulher e interpretando sua personagem de humor, Silvanelly, em um stand-up. Enquanto todos riem e se divertem com sua presença, o rosto de Joana entrega suas mágoas com a pessoa que se apresenta, e, mesmo que na intimidade da relação de parentesco, mal conhece.

 

Essa imagem é o retrato mais comum e poético do palhaço, aqui em uma versão moderna em relação à tradicional imagem do nariz vermelho e cabelo bagunçado. Na medida em que seu ofício é levar a alegria para as pessoas em sua volta, ele mesmo guarda para si suas próprias tristezas.

 

Mas para o palhaço Renato – ou Silvanelly, nos palcos -, Diogenes concede uma chance de redenção. A jornada que o protagonista terá a oportunidade de trilhar é a de um reconhecimento tardio de paternidade, decorrente de seu amadurecimento como pessoa e arrependimento pelo passado, mas não pela razão que deu causa à sua ausência, porém da omissão em relação ao crescimento da filha.

 

Nesse recorte de tempo, cerca de uma semana que ambos terão para conviver juntos até a mudança da filha de Fortaleza para outra cidade, a conexão de Renato e Joana é desenvolvida para muito além da fala. Demonstrando o bom uso da arte cinematográfica na construção de seu longa, Diogenes afasta o diálogo como o principal meio conciliatório, a partir de um notável desconforto e insegurança dos personagens em expressar os sentimentos um para o outro.

 

Então, se na conversa o pai e a filha não parecem se sentir à vontade para falar, ao menos nesse primeiro momento, que circunda toda a obra, os gestos se tornarão a maneira de comunicação que há entre eles. É onde mais se encontra a sensibilidade da direção, que sabe trabalhar no olhar e na linguagem corporal da ótima dupla Sutter Lis e Demick Lopes o que as palavras, naquele contexto, são incapazes de expressar. É um forte sentimento de amor paterno na busca pela reconciliação, que tenta recuperar, em uma semana, os quatorze anos perdidos.

 

Enquanto para Renato há uma narrativa de redenção, para Joana o contato com o pai é mais um passo na construção de sua identidade. E na medida em rapidamente a intimidade vai sendo criada entre os dois, a personagem conhece, por outro prisma, os eventos que a levaram ter um pai ausente, no sentido de compreender as razões e o entorno de sua própria história.

 

É onde também a trilha musical encontra destaque, enquanto é utilizada como mais um meio de aproximação. Não apenas por expressar verbalmente palavras que não conseguem ser ditas, mas é também mais uma espécie de ponte que se constrói entre pai e filha, no compartilhamento dos sentimentos e na conexão entre passado e presente, que muito fala, também, sobre o que havia entre Renato e a mãe de Joana.

 

Aos poucos, enquanto se encaminha para o final, A Filha do Palhaço ultrapassa a redenção para chegar à compreensão. Algumas mágoas serão eternas, mas existem situações que exigem uma ultrapassagem desse sentimento para que seja possível seguir em frente com a vida de maneira mais leve e com as pessoas certas ao nosso lado, ainda mais quando reconhecem seus erros e buscam repará-los. O passado é imutável, mas somos nós que construímos o futuro, e Pedro Diogenes espalha justamente essa ideia, na simplicidade da catarse produzida pela cena final, que encerra seu longa com uma sensibilidade ímpar, ao padrão de toda a obra.

 

Avaliação: 4/5

 

A Filha do Palhaço (Idem, 2024)

Direção: Pedro Diogenes

Roteiro: Amanda Pontes, Michelline Helena e Pedro Diogenes

Gênero: Drama

Origem: Brasil

Duração: 104 minutos (1h44)

Disponível: Cinemas (via Embaúba Filmes)

 

Sinopse: Joana, uma adolescente de 14 anos, aparece para passar uma semana com o pai, Renato, um humorista que apresenta seus shows em churrascarias, bares e casas noturnas de Fortaleza interpretando a personagem Silvanelly. Apesar de mal se conhecerem, pai e filha terão que conviver durante essa semana. Eles vão viver novas experiências, experimentar novos sentimentos e esse tempo juntos irá transformar profundamente a vida dos dois.

(Fonte: Sinny Comunicação - Adaptado)

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