Toxic até começa bem em sua crítica à indústria da moda, mas logo se reduz a um mais do mesmo em relação a tantos outros filmes similares.
Os minutos iniciais de Toxic são curiosos enquanto fazem o espectador testemunhar uma situação de bullying, na medida em que, apesar de todas as garotas no vestiário apresentarem um padrão de beleza semelhante, a protagonista possui um problema na perna que a faz mancar. É na base do desconforto que a diretora Saule Bliuvaite nos introduz a um dos mais complexos e cruéis universos que existem: o da moda.
A maneira em como adentramos a perspectiva de mundo das protagonistas se dá a partir de um formalismo estético bastante incômodo e provocativo, que através de planos inclinados e uma câmera que pouco se mantém parada nos passa uma sensação de desconforto e ansiedade comuns a todos os envolvidos naquele ambiente, procurando trilhar um caminho em meio à podridão e a falsa perfeição.
É o decadente contexto político, social e econômico da Lituânia atual que serve como base para todas as intenções por detrás das personagens, que sonham com uma vida fora de seu país, onde não encontram perspectiva. Ao mesmo tempo, no entanto, elas trabalham com as opções que possuem a própria frente, e nessa jornada tentando alcançar o sucesso, buscam, juntas, um lugar ao mundo para chamarem de seu.
Acontece que no decorrer dessa jornada, as escolhas formais e estéticas diferenciadas da direção acabam pouco significando algo depois de algum tempo, na medida em que o filme acaba recaindo em uma mesmice, revelando um grande ciclo vicioso na obsessão pela forma repetitiva, que reflete diretamente nas personagens, a todo tempo, precisarem se provar bem, mesmo quando evidentemente não estão.
Esse acompanhar das adolescentes de um lado para o outro anda lado a lado com o desgaste de seus corpos e mentes, perseguindo um sonho exigente demais. Acontece que essa caminhada rumo ao desconhecido tem dificuldade para nos imergir diante da sensação de ausência de progressão na narrativa, que busca um olhar próximo e realista, mas sem exatamente saber para onde segue.
É bastante diferente de uma sensação imprevisível, onde os arcos e elementos se ajustam de tal forma que rumam a algum lugar que não conseguimos mensurar. Aqui há uma grande repetição, que depois de algum tempo não parece mais extrair qualquer desenvolvimento daquele mundo e personagens, para além do que já havia sido feito e da noção que já temos, naturalmente, das dificuldades que encontrarão.
O pior disso tudo é que a deficiência na perna de uma das protagonistas, enfatizada em algumas passagens e na promissora cena inicial, que parece ser um dos principais objetos de debate a serem propostos por Toxic, acaba esquecido e escanteado a uma mera característica, que perde a importância frente a violência psicológica, drogas consumidas e as relações sexuais, que ganham certo ar alarmante quando as personagens são adolescentes entre treze e quatorze anos.
Assim, apesar do ótimo trabalho das jovens atrizes protagonistas, Toxic não possui grandes destaques em meio a tantos outros longas com abordagens críticas semelhantes à indústria da beleza e da moda, que encontram perspectivas mais originais para tratar do tema, sem necessariamente recorrer à genérica narrativa de pessoas perdidas procurando por um lugar no mundo, ancoradas por uma amizade. Não que seja algo ruim, mas também não há profundidade em como a diretora Saule Bliuvaite explora essa amizade, senão por relações tão anêmicas quanto toda a indústria da falsa perfeição e as próprias personagens com seus corpos, ainda mais quando o objeto que prometia tornar a obra diferenciada acabou esquecido no meio tempo, reduzido a uma mera característica que define uma personagem.
Avaliação: 2.5/5
Toxic (Akiplėša, 2024)
Direção: Saulė Bliuvaitė
Roteiro: Saulė Bliuvaitė
Gênero: Drama
Origem: Lituânia
Duração: 99 minutos (1h39)
77º Festival de Cinema de Locarno (Concorso Internazionale – Vencedor)
Sinopse: Sonhando em fugir da triste e pobre realidade de sua cidade industrial, duas meninas de treze anos, Marija e Kristina, formam um vínculo único em uma escola de modelos local, onde a promessa de uma vida melhor leva as meninas a violarem seus corpos de maneiras cada vez mais extremas.
(Fonte: Festival de Locarno - Adaptado)
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